Entre a Rio+20 e a COP30: o que eu já vi, vivi e o que eu espero
Participei ativamente da Rio+20, em 2012, e vivi de perto o entusiasmo e as contradições daquele momento. A conferência prometia inaugurar uma nova era para o desenvolvimento sustentável. Havia uma convicção quase unânime de que o planeta precisava mudar de rumo — e rápido. Passados treze anos, às vésperas da COP30 em Belém, o sentimento é de que muito se aprendeu, mas pouco se consolidou.
Na Rio+20, dois temas emergiram com força inédita: a erradicação da pobreza e a construção de cidades sustentáveis. Ambos simbolizavam a busca de soluções imediatas e palpáveis para o desenvolvimento sustentável. Enquanto persistirem bolsões de miséria e desigualdade, não há que se falar em equilíbrio ambiental. Da mesma forma, cidades desordenadas, densamente povoadas, sem mobilidade, saneamento ou gestão adequada de resíduos sólidos geram impactos tão severos quanto os das atividades industriais.
Essas questões foram amplamente debatidas à época, e esperava-se uma transformação estrutural nas políticas urbanas e sociais. Porém, os desafios jurídicos e econômicos logo se impuseram. A criação de normas que fixassem padrões de controle de emissões e atividades poluidoras dependia de um fundo internacional de financiamento sustentável — proposta que naufragou diante da resistência dos países desenvolvidos.
A partir dali, compreendi que a sustentabilidade não se constrói apenas com boas intenções diplomáticas. Ela exige governança, instrumentos concretos e coragem política. O poder público, nesse contexto, é ator central. Cabe-lhe zelar pelo meio ambiente ecologicamente equilibrado, seja pela fiscalização e regulação econômica, seja pela indução de boas práticas e pela formação da consciência cidadã.
Entretanto, o que predomina ainda hoje é a lógica reativa: licenciamento tardio, punições exemplares, multas milionárias — medidas que punem, mas raramente restauram o equilíbrio perdido. Falta-nos um giro protetivo, capaz de substituir a cultura da reparação pela da prevenção, como mandam as normas nacionais e internacionais de tutela ambiental.
Chegamos, então, à COP30 — e ao Brasil, que volta a ser protagonista global. A conferência em Belém, entre 10 e 21 de novembro, coloca o país no centro das atenções. O governo comemora o terceiro ano consecutivo de queda no desmatamento da Amazônia, com uma taxa de 5.796 km² — a terceira menor desde 1988, segundo o INPE/Prodes. Desde 2022, a redução acumulada já chega a 50%.
São avanços reais, mas a realidade é mais complexa. O Cerrado ultrapassou a Amazônia como o bioma mais desmatado do país: 652.197 hectares contra 377.953 hectares em 2024. A degradação florestal amazônica, menos visível que o corte raso, cresceu 25% no mesmo período. E, paradoxalmente, em 2025 o país aprovou o licenciamento para exploração de petróleo na Foz do Amazonas — um retrocesso em plena era de descarbonização.
O cenário global tampouco é animador. Os Estados Unidos confirmaram ausência de representantes de alto nível da Casa Branca na COP30. A União Europeia, outrora vanguarda climática, viu sua agenda verde ser freada pela Guerra da Ucrânia: orçamentos desviados da transição energética para defesa, dependência do gás russo e retorno temporário ao carvão. Enquanto isso, a China sinaliza protagonismo, enviando seu vice-primeiro-ministro ao evento.
O Brasil busca, legitimamente, consolidar sua liderança climática, mas precisa ser coerente. Não é possível celebrar avanços na Amazônia enquanto o Cerrado se torna o novo front do desmatamento, nem proclamar compromissos verdes enquanto se abre espaço para novos combustíveis fósseis.
A COP30 poderá ser histórica não pelos discursos, mas pela capacidade de transformar compromissos em ações verificáveis, integradas e transparentes.
Para gestores ambientais e urbanistas, o caminho é claro: fortalecer o monitoramento multibiomas, integrar o Zoneamento Ambiental Municipal (ZAM) aos Planos Diretores, priorizar adaptação climática e resiliência urbana — conforme as normas ISO 14090 e ABNT — e ampliar a governança participativa baseada em dados geoespaciais.
Desde a Rio+20, vimos que promessas sem estrutura não bastam. O futuro exige coerência, técnica e transparência. A verdadeira transformação começará no território — nas cidades, nas florestas, nas comunidades locais — onde a governança global, tantas vezes, falha.
É nesse espaço que ainda deposito minha esperança: que a COP30 concretize o que a Rio+20 sonhou.
