Clima
Min 23ºc - Max 32ºc Salvador
Calendário
segunda-feira, 17 de Novembro, 2025
Georges Humbert 27 de Outubro, 2025
Foto - Georges Humbert

Lei geral do licenciamento ambiental: os vetos que causaram um retrocesso sustentável

Sustentabilidade e meio ambiente
Foto - Georges Humbert
Georges Humbert 27 de Outubro, 2025

A Lei Geral do Licenciamento Ambiental, originada do PL 2.159/2021, foi sancionada em agosto de 2025 com 63 vetos parciais pelo presidente Lula, sob a justificativa de proteger o meio ambiente e garantir segurança jurídica. No entanto, os vetos atingiram dispositivos centrais, como as definições de porte e potencial poluidor (incisos XXXV e XXXVI do art. 3º), as dispensas de licenciamento para manutenções em infraestruturas preexistentes (inciso VII do art. 8º), a Licença por Adesão e Compromisso (LAC) para expansões e projetos de saneamento (art. 11), e os licenciamentos corretivos e especiais (arts. 25 e 26). Segundo o governo, as supressões seriam necessárias para evitar retrocessos ambientais. Na prática, contudo, mantêm o país preso a um sistema obsoleto e disfuncional.

Há décadas o Brasil opera sem uma lei federal de licenciamento, apoiado apenas em resoluções do Conama — como as nº 01/1986 e 237/1997 —, instrumentos infralegais, inconstitucionais e antidemocráticos, que nunca passaram pelo crivo do Congresso Nacional. Esse “vazio legal” gerou um verdadeiro labirinto normativo, com mais de 27 mil normas federais, estaduais e municipais conflitantes, submetendo empreendedores, gestores e cidadãos à insegurança jurídica e à morosidade. Pior: nem mesmo tragédias como Brumadinho, Mariana ou Maceió foram evitadas sob esse sistema, que se mostra incapaz de proteger o ambiente ou fomentar o desenvolvimento sustentável.

Os vetos à lei agravam essa paralisia. Ao impedir definições claras de porte e potencial poluidor, o governo perpetua a subjetividade nas decisões administrativas e inviabiliza a adoção de critérios científicos e tecnológicos — como o uso de inteligência artificial, drones e satélites — que modernizariam a gestão ambiental. Em vez de trazer segurança e transparência, os vetos mantêm o caos e a discricionariedade.

Entre os dispositivos mais importantes vetados está a Licença por Adesão e Compromisso (LAC), prevista para atividades de baixo e médio impacto. Diferente do que alegam setores contrários, a LAC não é uma “licença automática”, mas um instrumento consolidado e eficaz. Ela já é aplicada com sucesso em estados como Bahia e Ceará — inclusive sob gestões alinhadas ao atual governo federal — e possui respaldo do Supremo Tribunal Federal quanto à sua constitucionalidade. Baseada em critérios técnicos e autodeclaração validada, a LAC racionaliza o processo, reduz custos, incentiva a formalização e fortalece a fiscalização, que passa a atuar por amostragem e com penalidades severas em caso de falsidade. Vetar esse mecanismo é ignorar a ciência e a experiência nacional.

O mesmo vale para os artigos que previam dispensas de licenciamento em manutenções de infraestrutura, obras de saneamento e energia. Tais medidas não diminuíam a proteção ambiental, apenas eliminavam etapas redundantes e irracionais. Obras de dragagem, pavimentação ou manutenção de sistemas já existentes não têm o mesmo potencial de impacto que empreendimentos novos. Exigir licenciamento completo para cada pequena intervenção é travar o país, atrasando investimentos e comprometendo políticas públicas essenciais, como a universalização do saneamento básico — um dos maiores desafios ambientais e sociais do Brasil.

Outro retrocesso grave foi o veto à proporcionalidade nas condicionantes ambientais. O texto aprovado pelo Congresso buscava impedir abusos, como obrigar empreendedores a compensar danos de terceiros ou a resolver omissões do Estado. Essa previsão era não apenas justa, mas constitucional, à luz dos princípios da razoabilidade e da proporcionalidade. Ao vetá-la, o governo reforça uma lógica punitivista e irracional, que desestimula a responsabilidade ambiental legítima e perpetua um licenciamento mais burocrático que protetivo.

Os vetos aos licenciamentos corretivos e especiais também frustram uma oportunidade histórica de regularização ambiental responsável. Esses dispositivos permitiriam que atividades irregulares se adequassem mediante termo de compromisso, com suspensão de punibilidade após o cumprimento das exigências. É o caminho civilizado, que transforma passivos em soluções. Ao rejeitar essa possibilidade, o governo opta por manter um sistema punitivo, caro e ineficaz, que nem corrige nem previne.

No fundo, o que se observa é uma inversão de prioridades: o discurso ambientalista de fachada substitui a sustentabilidade real, que depende de equilíbrio entre proteção, eficiência e desenvolvimento. Sustentabilidade não é impedir o progresso, mas orientar o progresso com base na razão científica, na segurança jurídica e no bem-estar humano. Negar esse avanço é escolher o atraso.

Os vetos à recém-sancionada Lei Geral do Licenciamento Ambiental (Lei nº 14.968/2025) representam mais que uma divergência técnica: simbolizam a persistência de um modelo anacrônico, ideológico e ineficiente, que impede o Brasil de avançar rumo a uma sustentabilidade baseada em ciência, governança e racionalidade jurídica. Vai na contramão das democracias mais sólidas e avançadas, mantém o Brasil no atraso do século passado e na base de resoluções inconstucionais, ilegais, ilegítimas e antidemocráticas do Conama, tambem, ultrapassadas tecnicamente.

Manter os vetos à Lei Geral do Licenciamento Ambiental é perpetuar a ilegalidade, a insegurança e a irracionalidade. É impedir que o Brasil tenha, finalmente, uma lei democrática, moderna e justa, capaz de harmonizar desenvolvimento econômico com preservação ecológica. O país não precisa de mais burocracia ou ideologia; precisa de ciência, de técnica e de coragem política para transformar o licenciamento em instrumento de sustentabilidade e não em obstáculo ao futuro. Salvo alguns poucos acertos, os vetos, não a lei aprovada, que causaram mais um retrocesso sustentável em detrimento do progresso social, da erradicação da pobreza, da promoção de mais dignidade, do desenvolvimento econômico e do próprio quilíbrio dos ecossistemas.